O senador por Ohio e herdeiro político do ex-presidente Donald Trump, J.D. Vance, pregou união do Partido Republicano em seu primeiro discurso, na noite desta quarta-feira (17), como candidato a vice-presidente dos Estados Unidos. Segundo ele, embora a agremiação tenha muitas ideias diferentes, o mais importante é que esteja “unida para vencer”.
Vance foi ovacionado ao comentar a tentativa de assassinato contra Trump no último sábado (13), e ao atacar críticos que consideram Trump uma ameaça à democracia, em uma referência ao partido de Joe Biden.
“Disseram que ele [Trump] é um tirano, que ele deve ser impedido. E como ele respondeu? Ele pediu calma, pediu por união nacional literalmente momentos depois que um assassino tentou tirar sua vida. E, aí, ele veio até aqui em Milwaukee e voltou ao trabalho.”
O candidato a vice, logo no início do discurso, disse que a convenção republicana mostra o que os EUA já foram e o que, “com a graça de Deus”, voltarão a ser. Depois, atacou o presidente Biden, colocando na conta do democrata os efeitos da globalização que levaram ao fechamento de fábricas, à deterioração de antigos centros industriais e ao aumento da pobreza entre pessoas que dependiam desses empregos.
“Ao longo de 50 anos, Biden defendeu todas as medidas que deixaram os EUA mais fracos, e em apenas quatro anos Trump rompeu com tudo isso e favoreceu os trabalhadores”, disse. “Chega de paparicar o mercado, vamos atuar pelo trabalhador.”
“Trump é a última esperança de cumprirmos a promessa de que até um menino pobre como eu pode chegar a esse palco e se tornar o próximo vice-presidente dos EUA”, disse.
No geral, porém, o discurso não teve tom agressivo, mas Vance disparou ataques a imigrantes, países aliados “que não cumprem sua parte” na defesa do Ocidente, e a China, além de Biden por politicas em sua visão fracassadas que explicam o empobrecimento de sua região de origem.
Ele explorou sua história de sua vida —Vance é egresso de uma pequena cidade operária de Ohio— e frisou as necessidades do americano comum: moradia, emprego, saúde. Puxou aplausos para sua mãe, Beverly Vance, sentada próxima à Trump na plateia, “que lutou contra o vício e está sóbria há dez anos”.
Contou também anedotas de sua avó, dizendo que, à medida que ela foi envelhecendo e perdendo mobilidade, espalhou pela casa 19 revólveres, “para que sempre pudesse ter ao seu alcance um meio de proteger sua família”.
Autor do best-seller “Era Uma Vez Um Sonho”, livro adaptado para o cinema em 2020 que narra sua juventude pobre em Ohio, Vance representa a aposta de Trump na base que o levou à Casa Branca pela primeira vez: o eleitorado branco sem diploma das regiões empobrecidas do país.
A escolha de Vance também significa um aprofundamento do extremismo do Partido Republicano dominado por Trump. O senador repete a narrativa falsa de que houve fraude nas eleições de 2020 vencidas por Biden e afirma que, se fosse vice-presidente na época, teria obedecido Trump e se recusado a certificar o resultado do pleito no Congresso.
Antes do discurso do candidato a vice, a neta do ex-presidente Kai Trump foi ao palco. O discurso teve o objetivo de humanizar o emoresário, descrevendo um avô que dá aos netos “doces e refrigerante quando nossos pais não estão vendo” e se importa com a família.
Uma delegada da Virgínia Ocidental que acompanhava o discurso de Kai próxima à reportagem da Folha começou a chorar, chamando o discurso de “muito emocionante”. “Ele mostra o que os EUA realmente são.”
Donald Trump Jr., falando depois de Kai, mostrou a foto icônica do seu pai após o atentado. O público de mais de 2.000 pessoas reagiu em massa: “lute! Lute! Lute!”, imitando a reação do ex-presidente imediatamente após a tentativa de assassinato —alguns dos apoiadores do republicano na plateia estavam com um curativo na orelha, em alusão ao ferimento sofrido pelo ex-presidente no último sábado.
O discurso de Vance encerrou o terceiro dia da convenção republicana, que teve como tema “faça a América forte de novo”, uma variação voltada à política externa do slogan “faça a América grande de novo” que virou sinônimo da base mais fiel de Trump.
A lista de palestrantes contou com uma série de ex-militares de variadas patentes que repetiram a mensagem dos republicanos para o eleitorado americano nessa seara: a de que Joe Biden enfraqueceu a posição dos EUA no mundo, com inimigos como Rússia, Irã e China fortalecidos, e deixou o planeta mais inseguro, com duas guerras envolvendo Washington, a da Ucrânia e a da Faixa de Gaza, e com desastres militares no meio do caminho, como a retirada das tropas americanas do Afeganistão.
Os discursos seguiram uma linha mais isolacionista em termos de política externa. Vance, por exemplo, defendeu que os países aliados dos EUA cumpram sua parte na defesa, acusando-os de se aproveitaram dos investimentos em proteção de Washington. A posição é compartilhada pela ala mais à direita do Partido Republicano (e mais identificada com Trump), responsável por barrar no Congresso o envio de mais armas para a Ucrânia por meses, assustando especialmente aliados europeus, receosos do significado dessa postura para a relação do continente com Moscou.
O evento que oficializou a nomeação de Trump como candidato do partido também confirmou o domínio do ex-presidente sobre a agremiação, refletindo o culto à sua figura: a imagem do ex-presidente era onipresente no evento, com camisetas, canecas e bonecos vendidos em lojas no Fórum Fiserv e no Centro Baird, em Milwaukee, no estado de Wisconsin.
O rol de produtos que fazem referência ao empresário é amplo: ursinhos, brincos, broches, bonés, velas, adesivos. Muitos estampam a foto de Trump após ser fichado na Geórgia, parte do processo criminal em que é acusado de tentar reverter a derrota na eleição de 2020. Há itens ligados apenas ao partido, como o elefante que o simboliza, mas em quantidade muito menor.