Um atentado suicida numa igreja localizada nos arredores de Damasco, atribuído pelas autoridades da Síria ao Estado Islâmico, reacendeu o temor de que extremistas possam explorar a paz frágil no país, enquanto o governo recém-formado há seis meses tenta conter a escalada da violência após a queda do regime de Bashar al-Assad.
Ao menos 25 pessoas morreram e 63 ficaram feridas no ataque ocorrido no domingo (22) na igreja de Mar Elias, no subúrbio de Dweila, segundo autoridades de saúde sírias. O atentado, que ocorreu durante a missa, foi o mais letal contra cristãos no país desde a queda do regime de Assad em dezembro passado.
O Ministério do Interior da Síria afirmou na segunda-feira (23) que prendeu integrantes de uma célula do Estado Islâmico envolvida no planejamento do ataque e que matou “o principal responsável por facilitar a entrada do suicida na igreja”. No domingo, o ministério havia informado que o autor entrou na igreja atirando contra fiéis antes de detonar explosivos presos ao corpo.
“O alvo principal deste ataque não é apenas o componente cristão da Síria, mas todos os sírios, independentemente de sua afiliação religiosa”, disse o porta-voz do Ministério do Interior, Noureddine al-Baba, em entrevista coletiva.
Ele afirmou ainda que a pasta já havia frustrado atentados do Estado Islâmico contra o santuário de Sayyida Zeinab, local sagrado para os muçulmanos xiitas, e contra uma igreja em Maaloula, vila considerada a mais antiga comunidade cristã do mundo.
Tom Barrack, embaixador dos Estados Unidos na Turquia e enviado especial para a Síria, condenou o ataque em publicação na rede social X. “Esses atos terríveis de covardia não têm lugar no novo tecido de tolerância e inclusão que os sírios estão tentando tecer”, escreveu.
Já o coordenador residente da ONU na Síria, Adam Abdelmoula, pediu às autoridades que tomem “todas as medidas necessárias para proteger os civis, levar os responsáveis à Justiça e evitar que tragédias como essa se repitam”.
Karam Abou Janb, 33, disse ao jornal americano The Washington Post que estava próximo à igreja no momento do ataque e viu dois homens armados atirando nas pessoas do lado de fora. Um fugiu e o outro invadiu o templo. “Os homens na entrada tentaram impedir e tirar sua arma. Foi quando ele explodiu.”
Segundo ele, uma densa fumaça tomou conta do local e, ao se aproximar da entrada, viu “corpos despedaçados” —alguns estavam queimados e carbonizados. “Não aguentei e senti que ia desmaiar”.
Vídeos feitos após o ataque mostram quadros religiosos caídos das paredes, estilhaços de vidro espalhados pelo chão e entre os bancos da igreja.
O líder sírio, Ahmed al-Sharaa, disse em nota que seu governo mobilizará “todas as forças especializadas de segurança para capturar os envolvidos e os responsáveis por planejar esse crime hediondo”.
Mais tarde, Sharaa ligou para o arcebispo romano ortodoxo Romanos al-Hannat para oferecer condolências. Em áudio divulgado pela TV estatal, ele diz: “O mais importante é que permaneçamos fortes. Há pessoas incomodadas com a unidade nacional que foi construída na Síria.”
O ataque reacendeu os temores entre os cristãos do país, que vêm manifestando insegurança sobre seu futuro desde que Sharaa, ex-líder do grupo rebelde islâmico HTS (Organização para a Libertação do Levante, na sigla em árabe), assumiu o poder. Antes de a guerra civil começar em 2011, havia mais de 1,5 milhão de cristãos na Síria. Hoje, autoridades religiosas locais estimam cerca de 400 mil.
O bispo da Igreja Ortodoxa Síria, Augeen al-Kass, disse ao Post que se reuniu com outros bispos na segunda-feira para organizar o funeral das vítimas e definir medidas de segurança. “Há muito medo”, afirmou. “O medo não vem apenas deste episódio. É pelo que pode acontecer a seguir. Os fiéis também têm medo porque isso afeta diretamente a presença cristã na região.”
O Patriarcado Ortodoxo Grego da Síria pediu que as autoridades “assumam total responsabilidade pela violação da santidade das igrejas que está ocorrendo”.
Embora o novo líder sírio tenha tentado tranquilizar as minorias —incluindo membros drusos, alauítas e cristãos em seu governo, além de ter recebido uma delegação judaica em fevereiro—, sua gestão enfrenta dificuldades para conter a violência sectária.
Em março, confrontos na costa síria resultaram na morte de centenas de pessoas, a maioria da comunidade alauíta, vertente do islamismo xiita à qual pertence a família Assad. A violência foi desencadeada por uma insurgência inicial associada a ex-militares do antigo regime.
Em maio, ocorreram conflitos no sul do país entre membros da comunidade drusa e militantes islâmicos ligados ao novo governo sírio.
O governo também não conseguiu avançar na implementação de um acordo com as Forças Democráticas Sírias —apoiadas pelos EUA e lideradas por curdos— para integrar o nordeste do país ao restante do território nacional.
Aaron Y. Zelin, pesquisador sênior do Washington Institute for Near East Policy, afirmou que uma resposta rápida do governo e a restauração da igreja poderiam ajudar a aliviar os temores da comunidade. No entanto, ele alertou que a ausência de um processo nacional de justiça transicional “minimiza as chances de uma reconciliação mais ampla na sociedade”.