Aclamada como “A Libertadora”, numa alusão ao herói da independência venezuelana Simón “O Libertador” Bolívar, María Corina Machado recebeu nesta sexta-feira (10) o Prêmio Nobel da Paz por seu trabalho.
Com 58 anos completados no último dia 7, ela foi impedida de desafiar o ditador Nicolás Maduro nas eleições de 2024, depois detida e libertada após tentar reavivar a resistência ao líder venezuelano.
Em julho, María Corina convocou uma “resistência clandestina” contra Maduro, quando a reeleição do ditador, amplamente vista como fraudulenta pela comunidade internacional, completou um ano.
Há semanas circulam rumores nas redes sociais de que Machado estaria abrigada na embaixada dos Estados Unidos em Caracas. Ela vive em local não divulgado desde o aumento da repressão no país.
Apontada nas pesquisas como a política mais popular da Venezuela, María Corina aceitou ficar em segundo plano politicamente e fez campanha incansável por seu substituto de última hora nas urnas: o pouco conhecido ex-diplomata Edmundo González Urrutia.
Ela havia vencido as primárias da oposição com 90% dos votos em 2023, mas foi imediatamente declarada inelegível por autoridades leais a Maduro.
Então, abraçou a candidatura relutante de González, acompanhando-o em comícios e atraindo os holofotes que ele evitava.
Sempre vestida de branco, costuma aparecer em comícios com vários rosários no pescoço —presentes de apoiadores devotos.
Como se fosse uma estrela do rock, multidões corriam para vê-la ou tocá-la, erguendo bebês e crianças, oferecendo bilhetes manuscritos de apoio e presentes como bonés ou flores.
“¡Sí, se puede!” (“Sim, nós podemos!”), costumam gritar em seus comícios, enchendo as ruas para tentar se aproximar de sua caravana, subindo em telhados para conseguir uma melhor visão, tirando fotos com celulares e acenando bandeiras venezuelanas.
O entusiasmo gerado por María Corina, porém, pouco ajudou no dia da eleição, quando Maduro declarou vitória sem depois divulgar as atas eleitorais.
A União Europeia e diversos países reconheceram González como presidente eleito da Venezuela.
O anúncio do Nobel ocorre enquanto os Estados Unidos intensificam ataques em águas internacionais próximas à sua costa, alegando agir contra traficantes de drogas.
A ação militar americana matou pelo menos 21 pessoas nas últimas semanas.
Washington acusa Maduro de chefiar um cartel de drogas e não o reconhece como líder legítimo do país.
Em um vídeo conjunto no mês passado, María Corina e González apoiaram a pressão militar dos EUA sobre o regime de Maduro como uma “medida necessária” para a “restauração da soberania popular na Venezuela.”
Eles acusaram o governo de Maduro de traficar “drogas, minerais, metais, armas e seres humanos, entre muitos outros crimes.”
María Corina declarou separadamente que as gangues criminosas venezuelanas representam “uma ameaça real e crescente à segurança e à estabilidade” das Américas.
‘Tragam nossos filhos de volta’
Ao contrário de González, que se exilou na Espanha após receber ameaças pós-eleitorais, a líder opositora optou por permanecer na Venezuela para liderar a resistência na clandestinidade.
Ela adotou táticas de disfarce, aparecendo de surpresa na carroceria de caminhões em esquinas para fazer discursos antes de fugir na garupa de uma motocicleta para evitar a prisão.
Engenheira de formação e nascida em Caracas, Machado entrou na política em 2002 à frente da associação Súmate (“Junte-se a nós”), que promovia um referendo para revogar o mandato do mentor de Maduro, o falecido líder socialista Hugo Chávez.
Foi acusada de traição por propor o referendo e recebeu ameaças de morte, o que a levou a enviar seus dois filhos e sua filha para viver no exterior.
Impedida de concorrer em 2023, também foi proibida de voar e percorreu o país de carro, fazendo campanha por González com discursos vibrantes que foram recebidos com entusiasmo.
María Corina havia prometido pôr fim ao regime socialista cada vez mais repressivo, marcado nos últimos anos por uma grave crise econômica que levou sete milhões de pessoas —quase um quarto da população—a emigrar do outrora próspero país petroleiro.
“Vamos libertar o país e trazer nossos filhos de volta”, ela prometeu.
Em outubro, María Corina e González receberam o principal prêmio de direitos humanos da União Europeia, por terem “defendido destemidamente os valores da justiça, da democracia e do Estado de Direito.”