Há umas semanas viralizou um meme que chamava Portugal de “Guiana Brasileira”. O meu velho país europeu convertia-se no novo estado brasileiro, cá do outro lado do oceano. Vários nomes novos eram sugeridos para o território: os meus preferidos eram “Faixa de Gajos”, “Pernambuco de Pé” e “Rio de Fevereiro”.
Ninguém pode negar o talento que o Brasil tem para memes. Talvez o país ignore que a palavra meme foi usada por Richard Dawkins no seu “O Gene Egoísta”. Isso aconteceu numa era pré-histórica, antes da internet: 1976 (um ano antes de eu nascer). Qualquer pesquisa rápida no Google explica que o meme está para a memória como o gene para a genética.
Não sei se existe uma explicação científica para o talento que o Brasil tem para memes —vou poupar-me de teorizar. Mas que os memes adquirem no Brasil uma capacidade de reprodução excepcionalmente favorável, ninguém pode negar. Onde há um brasileiro há uma placenta cheia de memes prestes a nascer. Sem dores de parto.
Alguns portugueses não acharam graça. Pelo que vi na internet, eram nacionalistas. No seu ultrapatriotismo, sentiram-se ofendidos. Mas os portugueses minimamente tocados pelo saudável dom da moderação encontraram a piada. Sim, Portugal soube rir de ser visto como a “Guiana Brasileira”.
No meu caso, aproveitei até para celebrar e promover o meme da “Guiana Brasileira”. Por quê? A grande desilusão do português quando pela primeira vez visita o Brasil é concluir, surpreendido e arrasado, que ninguém pensa em portugueses. Sim, o português julga que, por causa da história, os brasileiros passam a vida a pensar nos portugueses. O coração fica despedaçado na constatação de que o brasileiro tem uma vida demasiado preenchida para gastar tempo recordando o país que, no mínimo, lhe deu a língua.
Logo, qualquer coisa que possa recordar ao brasileiro que os portugueses existem deve ser celebrada. Por isso, não só vi o meme da “Guiana Brasileira”, não só me ri com ele, como também o promovi, tentando com todas as minhas forças participar naquele momento fugaz em que Portugal era recordado pelos brasileiros. Por uns breves instantes, Portugal não ficou trancado no passado do Brasil. Portugal foi presente para vocês.
Mas que ninguém tome essa minha admissão como um conformismo de um derrotado. Pelo contrário. Os portugueses, por viverem esquecidos e apenas ocasionalmente evocados em piadas, já vivem mais no futuro. Os brasileiros, com todas as expectativas típicas de um país mais jovem, ainda se julgam destinados às energias da memória constante. Eu não sei como o futuro vai acontecer, mas, como pastor evangélico, tenho a certeza de que será uma experiência global e bíblica de grande esquecimento do passado.
No Apocalipse da Bíblia, os lembrados serão esquecidos e os esquecidos serão lembrados —também é isso que está em causa quando se fala que os primeiros serão os últimos e os últimos, os primeiros. O meme da “Guiana Brasileira” inventou um futuro onde Portugal deixava de ser Portugal. O meme acertou parcialmente porque no futuro bíblico todos os países deixarão de ser os países que por enquanto são —até os grandões como o Brasil.
No plano da eternidade cristã, todas as nações perderão as suas fronteiras para se fundirem numa terra em que a nacionalidade é ser estrangeiro —a Nova Jerusalém. O Paraíso será o lar dos sem-terra. Só poderá ser proprietário no céu quem na terra não tiver casa. Habitaremos Guianas celestes e isso terá uma graça infinita.