Uma carta pública do ex-chanceler Álvaro Leyva balançou as estruturas do governo Gustavo Petro. Até pouco tempo um dos aliados mais próximos do presidente, Leyva rompeu o silêncio e lançou acusações graves sobre a vida pessoal de Petro, afirmando que ele sofre de dependência química — um problema que, segundo o ex-ministro, comprometeria a capacidade de governar do primeiro presidente de esquerda da história colombiana. O conteúdo da carta, escrito em tom confessional, escancarou aquilo que há tempos era um segredo mal guardado nos bastidores do poder: os supostos vícios do presidente.
A acusação remete a um episódio ocorrido em 2023, durante uma visita oficial a Paris, quando Petro teria “desaparecido por dois dias”.
A reação do presidente seguiu o padrão habitual: sarcasmo e ataques à imprensa. Disse que seu único vício era o café colombiano.
Leyva, afastado da vida pública e inabilitado para cargos oficiais, foi figura central nos primeiros meses da gestão. Como chanceler, foi um dos que desenharam a chamada “paz total“, política ambiciosa que pretende negociar simultaneamente com todos os grupos armados do país. Sua saída representou não apenas uma ruptura institucional, mas o fim de uma das pontes mais sólidas entre Petro e os setores moderados da elite política.
Na mesma carta, Leyva também atacou o ministro do Interior, Armando Benedetti, que teria admitido problemas semelhantes. “Concluí que se tratava de um enfermo. E segue igual, senhor presidente”, escreveu. Em outra ocasião, já havia lembrado que o próprio Benedetti se definira como “drogadicto“.
Mesmo após protagonizar o vazamento de áudios em que acusava a campanha de Petro de financiamento ilegal, Benedetti foi reconduzido ao centro do poder, causando uma grande crise no gabinete, há três meses. Sua permanência reforça a imagem de um governo refém de lealdades equivocadas.
A crise pessoal se soma à crise política. As reformas centrais do governo que dependem do Parlamento continuam travadas, e a base que o elegeu em 2022 está cada vez mais esfacelada. Ao longo dos últimos meses, a impopularidade das propostas de Petro no Congresso — majoritariamente opositor — minou o apoio da coalizão Pacto Histórico, originariamente de centro-esquerda, da qual hoje resta pouco mais que o nome. Para seguir no cargo, Petro recorre a forças fisiológicas da centro-direita, em nítido contraste com o discurso de ruptura que o levou ao poder.
Parlamentares têm colocado obstáculos às reformas propostas de Petro, e o Legislativo tem agora de avaliar se aprova ou não a realização de um referendo sobre a legislação trabalhista do país.
Sem apoio consistente, e após sucessivas trocas de gabinete, Petro tenta agora costurar um “acordo nacional” com setores tradicionais. A proposta, porém, é vista com desconfiança por sua própria base e com frieza pelos adversários. Dos dois lados, há o questionamento se Petro não é hoje refém de seus vícios e incapaz de governar.
Mais da metade de seu mandato já passou —e logo começa a corrida pela sua sucessão. Petro ainda tem tempo para tentar retomar a iniciativa, mas a janela de oportunidade se estreita a cada semana. As declarações de Leyva romperam um pacto de silêncio e deram corpo aos fantasmas que já rondavam a Casa de Nariño, sede do Executivo.
Com o enfraquecimento do governo colombiano, perde também o Brasil, que havia feito um gesto estratégico de aproximação com a Colômbia há um ano, em visita de Lula a Bogotá, quando se estabeleceram linhas gerais de ações conjuntas — até aqui não cumpridas ou cumpridas parcialmente. Neste cenário, elas deixam de ser prioritárias.