Como Marco Rubio passou de crítico a principal secretário de Trump – 18/08/2025 – Mundo

Como Marco Rubio passou de crítico a principal secretário de


No dia 11 de julho, John Dinkelman, um diplomata veterano, foi informado através de um e-mail conciso que estava sendo demitido após 37 anos no serviço diplomático dos Estados Unidos. Ele teve seis horas para arrumar suas coisas e ir embora.

Dinkelman foi um dos 246 funcionários do serviço exterior e 1.107 servidores públicos que foram demitidos neste mês em uma sangria que tem poucos precedentes nos 236 anos de história do Departamento de Estado.

O expurgo prejudicará a reivindicação dos EUA à liderança global, diz ele. “Destruir esta força de trabalho é como demitir seus soldados no meio de uma guerra —míope, desestabilizador e algo do qual é difícil de se recuperar”, afirma Dinkelman, que é chefe da AFSA, o sindicato trabalhista para servidores do serviço exterior.

O mais chocante para muitos observadores foi a identidade do homem que liderou as demissões: Marco Rubio, o secretário de Estado americano. Outrora um porta-estandarte do soft power do país, ele hoje ataca o braço diplomático do governo de maneiras que seus críticos dizem ser absolutamente inesperado, considerando a carreira política dele até o momento.

Chris Van Hollen, senador democrata, resumiu a decepção compartilhada por alguns no Capitólio em maio. Embora ele e Rubio fossem de partidos diferentes, ele presumia que compartilhavam valores comuns: “Uma crença na defesa da democracia e dos direitos humanos no exterior e no respeito à Constituição em casa”. Por isso, disse, votou para aprová-lo ao cargo em sabatina no Senado.

“Acreditei que você defenderia esses princípios. Você não o fez. Fez o oposto”, disse ele.

A transformação de Rubio encapsula a forma pela qual a visão dos EUA sobre seu lugar no mundo mudou sob o presidente Donald Trump. Um país que era peça fundamental da ordem internacional do pós-guerra retraiu-se para o isolacionismo do “América Primeiro”, definido pelo desdém por instituições multilaterais e aliados tradicionais, e pela abordagem altamente transacional de Trump à política externa.

Desde o início, Rubio se moveu para alinhar o Departamento de Estado com a agenda populista de direita de Trump. Ele desmantelou a Usaid, a agência de ajuda externa do país, eliminou ou reduziu departamentos inteiros que promovem a democracia e os direitos humanos em todo o mundo e, efetivamente, encerrou a emissora Voz da América. Ele também voltou a retirar os EUA da Unesco, a agência da ONU para educação e cultura, dizendo que ela promovia “causas sociais e culturais divisivas”.

O secretário de Estado defendeu suas reformas de uma agência que ele chamou de inchada e burocrática que estava “mais comprometida com a ideologia política radical do que com o avanço dos principais interesses nacionais da América”.

Mas muitos em Washington ficaram atônitos com suas ações no cargo e o quanto ele parece ter se afastado dos princípios que antes defendia.

Como senador, Rubio era um fervoroso defensor da assistência americana no exterior, das alianças de longa data de Washington e do poder da diplomacia dos EUA como uma força para o bem no mundo. Ele enfatizava a necessidade de enfrentar ditadores e apoiar dissidentes que lutam contra regimes autoritários.

No entanto, desde então, ele abraçou a ideologia Maga de Trump (Make America Great Again), com seu isolacionismo, impaciência com ajuda externa e determinação em reduzir drasticamente a força de trabalho federal.

Críticos acusam Rubio de oportunismo, dizendo que ele cinicamente abandonou suas crenças fundamentais para avançar na carreira. Nessa narrativa, as esperanças de Rubio de se tornar o candidato republicano à presidência em 2028 dependem de conquistar a base Maga e aproveitar o mesmo sentimento de ressentimento que catapultou Trump para a Casa Branca em 2016 e 2024.

“Ele não é o primeiro político a sacrificar princípios pela ambição política”, escreveu James Nealon, ex-embaixador dos EUA em Honduras. “Mas ele certamente elevou isso a outro nível.”

Mas aliados rejeitam a ideia de que Rubio mudou, insistindo que em questões-chave ele tem sido notavelmente consistente. Longe de abandonar seus valores, dizem, ele os defendeu, influenciando Trump a adotar uma postura mais agressiva em relação a países como China, Irã, Rússia e Venezuela.

“Na China, Rússia e Ucrânia, e Irã, vemos uma política externa americana revigorada e uma reafirmação do papel da América no mundo”, diz um amigo e ex-assessor. “E grande parte disso se deve aos conselhos de alto nível que o secretário está dando ao presidente e ao resto da administração no dia a dia.”

De fato, o homem que Trump ridicularizou como “pequeno Marco” durante as primárias republicanas de 2016 é agora, possivelmente, o secretário mais poderoso do gabinete do presidente. Além de secretário de Estado, ele tem sob sua alçada o cargo de conselheiro de segurança nacional interino, administrador interino da Usaid e chefe interino da Administração Nacional de Arquivos e Registros.

Rubio também melhorou sua posição com os linha-dura do Maga que antes o consideravam perigosamente brando na imigração. Ex-inimigos como Stephen Miller, chefe de gabinete adjunto da Casa Branca, e Steve Bannon, estrategista-chefe de Trump durante seu primeiro mandato, agora o consideram um aliado.

“Ele será o Kissinger do nosso tempo”, disse Miller sobre Rubio na Fox News em maio. “E estou orgulhoso de trabalhar ao lado dele.”

Rubio é o exemplo típico de um certo tipo de político republicano que passou a ver a globalização e o neoliberalismo como um erro, diz Daniel Drezner, professor de política internacional da Universidade Tufts. “Mas no caso de Rubio, parece mais uma tática política do que qualquer outra coisa. Nos últimos cinco anos, é quase como se ele estivesse buscando uma justificativa intelectual para explicar por que se tornou totalmente Maga”, disse Drezner.

Aliados defendem a aparente mudança ideológica de Rubio. “O ambiente político é completamente diferente do que era em 2010”, diz um assessor. “Ou você evolui como político ou perde eleições.”

Muitos em Washington veem Rubio, filho de imigrantes cubanos que foi eleito para a Câmara dos Deputados da Flórida com apenas 28 anos, como um republicano mainstream que gradualmente pendeu para a direita à medida que Trump apertava seu controle sobre o Partido Republicano. Outros veem de forma diferente.

“Marco sempre foi muito conservador, assim como o partido Republicano da Flórida”, diz Dan Gelber, então líder democrata na Câmara da Flórida. “Era quase como um laboratório conservador para o resto do país.”

No entanto, grande parte do apelo de Rubio estava enraizado não em sua oposição a um governo inchado e apoio a menos impostos, mas em seu sucesso em articular o sonho americano —uma mensagem otimista que era o oposto da “carnificina americana” distópica que Trump descreveu em seu primeiro discurso inaugural.

“Ele tinha essa compreensão instintiva da atração que a América exerce para populações imigrantes, e um profundo respeito por nossos documentos fundadores e nossas instituições políticas”, diz Whit Ayres, um pesquisador republicano que trabalhou para ele durante sua candidatura presidencial de 2016.

Contemporâneos ficaram impressionados com sua retórica atual. Gelber lembra-se de avisar o grupo democrata que “quando Marco Rubio fala, mulheres jovens suspiram, mulheres idosas desmaiam e os vasos sanitários se descarregam sozinhos”. “Ele realmente entendia como fazer as pessoas sentirem coisas”, diz ele.

Em 2010, Rubio fez uma das maiores apostas de sua carreira, concorrendo contra o moderado governador republicano da Flórida, Charlie Crist, por uma cadeira no Senado dos EUA. Sua campanha, escreveu em suas memórias de 2012, “An American Son” (Um filho americano), fazia parte de uma “batalha nacional entre conservadores e moderados pela alma do Partido Republicano”.

O partido, disse ele, havia “se desviado demais de [seus] princípios conservadores” e estava falhando “em contrapor a deriva para a esquerda em Washington” sob o presidente Barack Obama. Rubio venceu, parte da bem-sucedida onda do “Tea Party” do início dos anos 2010.

A campanha incorporou a essência de seu credo político, dizem os aliados. “Ele era um insurgente, disruptivo do status quo”, diz o assessor.

Enquanto estava no Senado, Rubio adotou posições tipicamente neoconservadoras que não divergiam significativamente do consenso do Partido Republicano da época. Ele frequentemente alertava sobre as ameaças que Rússia, China e Irã representavam para os interesses dos EUA e defendia uma economia aberta e o livre comércio. Ele também argumentava que a política externa dos EUA deveria defender os valores americanos tradicionais —direitos humanos, democracia e proteção da soberania dos aliados dos EUA.

“Onde quer que a liberdade e os direitos humanos se espalhem, nascem parceiros para nossa nação”, disse ele em 2015.

A reforma do sistema de imigração era um interesse fundamental dele. Rubio foi membro do chamado “grupos dos oito”, um grupo bipartidário no Congresso que propôs um projeto de lei que combinaria um melhor controle da fronteira dos EUA com um caminho legal para obtenção de cidadania para 11 milhões de imigrantes indocumentados. O projeto fracassou devido à oposição de políticos de direita em seu próprio partido.

Mas ele continuou a demonstrar simpatia pelos imigrantes, mesmo os indocumentados. No seu livro de memórias, ele disse que as pessoas que vêm ilegalmente para os EUA “estão fazendo exatamente o que nós faríamos se vivêssemos em um país onde não pudéssemos alimentar nossas famílias”.

“Se meus filhos fossem dormir com fome todas as noites e meu país não me desse oportunidade de alimentá-los, não haveria lei, por mais restritiva que fosse, que me impediria de vir para cá”, escreveu.

Rubio ficou horrorizado com a candidatura presidencial de Trump em 2015, chamando-o de “vigarista” que havia “passado uma carreira prejudicando os americanos trabalhadores”. Ele ridicularizou suas propostas linha-dura sobre imigração, dizendo: “Não vamos reunir e deportar 12 milhões de pessoas”.

Foi após a surpreendente vitória de Trump em 2016 que as visões de Rubio começaram a mudar. Ele cada vez mais adotou argumentos que pareciam emprestados do manual do presidente eleito.

“Rubio está longe de ser o único que de certa forma alterou seu tom para ser relevante na era Trump”, diz o pesquisador republicano Ayres. “Porque não há dúvida de que o partido Republicano hoje em dia é o partido de Donald Trump.”

Em 2023, Rubio publicou uma polêmica com tons trumpistas que refletia essa mudança em seu pensamento. “Decades of Decadence: How Our Spoiled Elites Blew America’s Inheritance of Liberty, Security, and Prosperity” (Décadas de decadência: como nossas elites mimadas desperdiçaram a herança americana de liberdade, segurança e prosperidade) descreve como as políticas econômicas neoliberais haviam esvaziado a base industrial da América.

Mas “ele convenientemente esqueceu de mencionar que essas eram todas coisas em que ele acreditava há 15 anos”, diz Drezner, o professor de Tufts.

Rubio cada vez mais parecia imitar a retórica de Trump. Falando ao programa Meet the Press da NBC em maio de 2024, ele descreveu a imigração descontrolada como “uma invasão” que “precisa ser tratada drasticamente”. Foi um forte contraste com seu livro de memórias, no qual escreveu que não suportava ouvir imigrantes descritos em “termos mais apropriados para uma praga de gafanhotos do que seres humanos”.

Desde que assumiu o Departamento de Estado, ele tem se mostrado um executor leal da vontade do presidente. Talvez o desdobramento mais significativo durante sua gestão tenha sido o esvaziamento da Usaid: 83% de seus programas foram encerrados, 94% de seus funcionários demitidos e suas funções restantes absorvidas pelo Departamento de Estado.

Observadores ficaram chocados. Como senador, Rubio frequentemente elogiava o trabalho da Usaid, louvando seus esforços de ajuda após furacões na América Latina, sua contribuição para combater a pólio e o ebola e a ajuda que fornecia aos refugiados venezuelanos que fugiam do regime de Nicolás Maduro.

No entanto, em uma postagem de blog em 1º de julho, ele criticou duramente a agência. “Além de criar um complexo industrial de ONGs de alcance global às custas dos contribuintes, a Usaid tem pouco a mostrar desde o fim da Guerra Fria”, disse ele.

Rubio insistiu que o fechamento da Usaid não significa que os EUA estão se retirando do mundo. Falando perante o Comitê de Relações Exteriores do Senado em maio, ele disse que havia visitado 18 países em 18 semanas e visto alguns ministros das Relações Exteriores “mais do que vi meus próprios filhos”. “Isso não se parece muito com uma retirada”, afirmou.

Em julho, ele se gabou de algumas das vitórias da política externa da gestão Trump. Ela intermediou uma trégua entre Índia e Paquistão, ambos com armas nucleares, e um acordo de paz entre a República Democrática do Congo e Ruanda. Persuadiu os membros da Otan a gastarem 5% de seu PIB em defesa até 2035. E atacou as instalações nucleares do Irã. “E nem se passaram seis meses”, disse ele.

No entanto, é óbvio que a maneira como os EUA se relacionam com o resto do mundo está mudando, às vezes de maneiras dramáticas.

Durante uma viagem à Arábia Saudita em maio, Trump disse que “muitos presidentes americanos foram afligidos pela noção de que é nosso trabalho olhar para as almas de líderes estrangeiros e usar a política dos EUA para fazer justiça por seus pecados”. Isso agora estava terminando, disse ele.

“Biden priorizou os direitos humanos acima de tudo em nosso relacionamento com os sauditas e acabou afastando-os”, diz o assessor de Rubio. “Marco está mudando isso.”

Mas a ironia é que as intervenções dos EUA não pararam —é apenas a ideologia que as sustenta que mudou. Em maio, depois que a inteligência alemã designou o partido Alternativa para a Alemanha (AfD), de extrema-direita, como uma organização extremista, Rubio expressou sua indignação no X. “Isso não é democracia, é tirania disfarçada.” Irritado com a postagem, o chanceler alemão Friedrich Merz pediu aos EUA para “ficarem fora” da política interna alemã.

O Departamento de Estado sob Rubio também fechou a maioria dos programas de reassentamento de refugiados, enquanto acelerou os pedidos de asilo para famílias brancas da África do Sul que alegam perseguição racial em seu país —alegações que foram amplamente desacreditadas. “Você se afastou de um genocídio no Sudão e inventou um na África do Sul”, disse Van Hollen a Rubio em maio.

Os democratas ficaram alarmados com outros desenvolvimentos recentes no departamento. Rubio revogou os vistos de estudantes não americanos que participaram de protestos nos campi contra a guerra de Israel contra o Hamas em Gaza, chamando-os de “lunáticos”. Ele instruiu os oficiais consulares a examinar as redes sociais dos solicitantes de visto para ver se representam uma ameaça à segurança nacional dos EUA.

Em fevereiro, Rubio fechou um acordo controverso com El Salvador, segundo o qual o Estado centro-americano prometeu receber e encarcerar migrantes ilegais criminosos. Grupos de direitos humanos disseram que as pessoas estão sendo removidas sem o devido processo legal. Autoridades afirmam que o acordo tem como alvo principalmente membros de gangues criminosas violentas.

Enquanto isso, a proliferação de papéis que Rubio assumiu levou a ocasionais problemas de agenda. No início de maio, menos de uma semana depois de Trump nomeá-lo conselheiro interino de segurança nacional, ele deveria se dirigir ao corpo diplomático em Washington pela primeira vez. Mais de cem embaixadores e diplomatas seniores se reuniram para a recepção. Mas, segundo vários diplomatas que participaram do evento, ele nunca apareceu, para frustração deles.

Eles afirmaram que o vice de Rubio, Christopher Landau, tentou agradar os dignitários reunidos brincando que o secretário tinha assumido tantos cargos que agora que estava sobrecarregado de trabalho.

Aliados insistem que tudo o que Rubio está fazendo no Departamento de Estado é consistente com a visão de mundo que ele defendeu durante grande parte de sua carreira. “Ele sempre disse que a ajuda externa deve estar nos interesses da América, sempre reclamou de como os EUA estavam exportando e projetando políticas sociais progressistas em outros países, e sempre acreditou que os EUA não podem ser o policial do mundo”, diz o ex-assessor.

Mas outros estão desapontados com suas ações no cargo.

Uma alta funcionária do Departamento de Estado demitida neste mês diz que Rubio era um homem “com quem muitos de nós interagimos por anos e respeitamos”. “Pensávamos que ele defenderia o Departamento de Estado e garantiria que especialistas experientes e comprometidos ainda tivessem voz na política e na diplomacia”, acrescenta. “Acabou que estávamos errados.”



Fonte CNN BRASIL

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