O coronel Michael Randrianirina será empossado líder do Madagascar na próxima sexta (17), segundo comunicado divulgado pelo regime na televisão local, dias após comandar um golpe de Estado que depôs o presidente Andry Rajoelina. Todo o processo, bem como as instituições do país, serão supervisionados por um comitê militar.
O movimento consolida o controle dos militares sobre o país da África, afundado numa crise política após duas semanas de protestos e deserções de integrantes das forças de segurança. Em represália, a União Africana (UA), que reúne 55 países do continente, suspendeu Madagascar de suas atividades, em decisão que tem “efeito imediato”, disse o presidente da organização, Mahamoud Ali Youssouf, à agência AFP.
Trata-se do mesmo padrão aplicado nos últimos anos pela UA contra outros países em que militares assumiram o poder à força, incluindo Burkina Fasso, Gabão e Níger. “O Estado de Direito deve prevalecer sobre o Estado de Força. Nossa abordagem se baseia na lei e no diálogo”, disse Youssouf em reunião da organização. A suspensão tem peso político e pode isolar a nova liderança do Madagascar.
Rajoelina, que sofreu impeachment no Parlamento depois de deixar o país no fim de semana, vem denunciando o golpe e se recusa a formalizar sua renúncia. Ele fugiu de Madagascar no domingo (12) a bordo de um avião militar francês, segundo autoridades ouvidas pela agência de notícia Reuters, e agora estaria em Dubai. Em comunicado, justificou a viagem com o argumento de que sua vida estava em risco.
Durante entrevista coletiva em Antananarivo, a capital de Madagascar, Randrianirina voltou a dizer que militares assumiram o poder e dissolveram todas as instituições, com exceção da Assembleia Nacional. “Seremos empossados em breve. Assumimos as responsabilidades”, disse ele. À agência de notícias Associated Press, afirmou ainda que está “assumindo o cargo de presidente”.
Autoridades próximas ao novo líder disseram à agência Reuters que a cerimônia de posse deverá ocorrer nos próximos dias. Segundo Randrianirina, a transição será conduzida por uma junta militar e deverá durar até dois anos, período em que um governo provisório será responsável por reestruturar as instituições e preparar novas eleições. Todo o processo será supervisionado por um comitê formado por oficiais do Exército e da polícia.
Ex-comandante da unidade de elite Capsat, que também desempenhou papel decisivo no golpe de 2009 que levou Rajoelina ao poder, Randrianirina rompeu com o antigo aliado na semana passada, após pedir aos soldados que não reprimissem manifestantes durante os protestos de rua.
Rajoelina, 51, o presidente destituído, é ex-DJ e empresário que chegou ao poder em 2009 impulsionado por um movimento de jovens, tornando-se à época, aos 34 anos, um dos chefes de Estado mais novos em todo o mundo. No entanto, as promessas de combate à corrupção e de melhoria das condições de vida da população não se concretizaram.
Além da unidade Capsat, tanto a polícia quanto outras forças de segurança também romperam com Rajoelina nos últimos dias, o que acelerou o colapso do governo.
A crise preocupa a comunidade internacional. Nesta terça, a Rússia disse que monitora de perto a situação “com ansiedade”. Afirmou ainda esperar que o derramamento de sangue fosse evitado.
Nos últimos anos, a Rússia vem ampliando sua presença e influência na África, em parte com o grupo mercenário Wagner. Segundo o jornal americano The New York Times, o grupo esteve ativo em Madagascar durante a eleição presidencial de 2018, oferecendo apoio estratégico e operacional a candidatos alinhados aos interesses de Moscou.
Com cerca de 30 milhões de habitantes, Madagascar é um dos países mais pobres do mundo: três quartos da população vivem na pobreza. Segundo o Banco Mundial, o PIB per capita do país caiu 45% entre a independência de 1960 e 2020.
A saída de Rajoelina marcou a segunda vez em poucas semanas que jovens manifestantes derrubam um governo em meio a uma onda de revoltas da chamada geração Z pelo mundo. Em setembro, protestos massivos no Nepal começaram com a proibição das redes sociais pelo governo e, após violência nas ruas e dezenas de mortes, terminaram com a renúncia do então primeiro-ministro.
Em seguida, a ex-chefe da Suprema Corte do país Sushila Karki foi nomeada governante interina com apoio dos manifestantes. O presidente do Nepal, então, dissolveu o Parlamento e marcou eleições para março de 2026.