Enquanto a atenção mundial se volta para o Irã, alvo de ataques de Israel desde a última sexta-feira (13), os bombardeios que devastaram a Faixa de Gaza nos últimos 20 meses seguem matando palestinos —nesta quarta-feira (18), mais de 140 pessoas morreram em ofensivas de Tel Aviv no território, segundo autoridades locais.
De acordo com a Defesa Civil, 14 delas foram mortas por disparos de soldados israelenses contra multidões que tentavam conseguir comida —ocorrência que virou rotina desde que a entrega de ajuda passou a ser feita por uma recém-criada entidade apoiada por Israel e Estados Unidos. Desta vez, as vítimas aguardavam caminhões de ajuda trazidos pelas ONU ao longo da estrada Salahuddin, no centro de Gaza.
Na terça (17), antes do último incidente, o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas, disse que, desde que a distribuição de ajuda foi retomada, no final de maio, 397 palestinos foram mortos e mais de 3.000 ficaram feridos enquanto tentavam conseguir algum mantimento.
Antes disso, Tel Aviv havia bloqueado totalmente a entrada de ajuda humanitária por quase três meses, o que deixou o território em condições catastróficas, segundo relatos de organizações locais nos quais se baseia a imprensa internacional, também impedida de entrar em Gaza por Israel.
Outras 21 pessoas morreram em ataques aéreos por toda a Faixa de Gaza, segundo autoridades locais —um no campo de refugiados de Maghazi, no centro do território, outro no bairro de Zeitoun, no norte, e um terceiro em um acampamento de tendas em Khan Yunis, no sul.
Israel diz que está investigando as mortes de pessoas que esperavam por comida e que os outros ataques se deram para “desmantelar as capacidades militares do Hamas”, com “precauções viáveis para mitigar danos a civis”.
Moradores de Gaza, que abriga mais de 2 milhões de pessoas em um dos territórios mais densos do mundo, se mostram preocupados de que os ataques entre Israel e Irã nos último dias aumentem a indiferença em relação ao conflito.
“As pessoas estão sendo massacradas em Gaza, dia e noite, mas a atenção mudou para a guerra Irã-Israel. Há poucas notícias sobre Gaza nesses dias”, disse à agência de notícias Reuters Adel, um morador da Cidade de Gaza, no norte. “Quem não morre das bombas israelenses morre de fome. As pessoas arriscam suas vidas todos os dias para conseguir comida, e também são mortas e seu sangue mancha os sacos de farinha que pensavam ter conquistado.”
Shaban Abed, pai de cinco filhos e também morador do norte de Gaza, concorda que o território está sendo esquecido. “Talvez estejamos felizes em ver Israel sofrer com os foguetes iranianos, mas, no fim das contas, mais um dia nesta guerra custa a vida de dezenas de pessoas inocentes”, afirmou. “Só esperamos que uma solução abrangente possa ser alcançada para acabar com a guerra em Gaza também.”
O conflito já matou quase 55 mil palestinos —mais de 2% da população—, de acordo com o Ministério da Saúde de Gaza, deslocou quase todos os moradores do território e causou uma grave crise de fome, o que levou a acusações de genocídio e crimes de guerra que Israel nega.
Grande parte da ajuda entrando no território está sendo canalizada pela Fundação Humanitária de Gaza, entidade criada este ano para e apoiada por Israel e EUA. O grupo privado atua com apenas quatro pontos de distribuição —quantidade considerada insuficiente para a escassez no território. Sob o sistema de distribuição anterior, coordenado pela ONU, havia cerca de 400 pontos.
Segundo autoridades israelenses, a fundação vai verificar se as famílias atendidas têm envolvimento com o Hamas antes de distribuir a comida, o que viola princípios humanitários de neutralidade e imparcialidade.