O presidente do Equador, Daniel Noboa, anunciou para 14 de dezembro uma nova consulta popular —na prática, um referendo para alterar a Constituição— com sete perguntas que abarcam desde a permissão para a instalação de bases militares estrangeiras no país até reduzir o número de parlamentares e autorizar o funcionamento de cassinos em hotéis cinco estrelas.
As questões são, em grande parte, técnicas e pouco decisivas para o futuro imediato do sistema político, mas todas tendem a deslocar, mesmo que marginalmente, o equilíbrio de poder no país em favor do Executivo.
Embora Noboa tenha maioria na Assembleia do país, que é unicameral, e um mandato renovado relativamente recente, preferiu recorrer à consulta como instrumento político, em vez de submeter as mudanças ao Parlamento.
A motivação central parece ser menos a necessidade de uma aprovação legislativa e mais uma estratégia para que o presidente se mantenha em uma espécie de campanha permanente, renovando capital político e reforçando sua imagem de líder personalista e popular. Trata-se de um recurso que já utilizou no início de 2024, quando submeteu aos eleitores um referendo com 11 perguntas. Naquele, porém, venceu nas que tratavam de segurança, mas perdeu nas relacionadas à economia, o que lhe custou popularidade no curto prazo e travou avanços no médio prazo.
Além de preparar a consulta popular, Noboa ampliou recentemente o estado de emergência por 60 dias nas províncias costeiras de Guayas, El Oro, Los Ríos e Manabí, onde a violência ligada a grupos armados organizados vem disparando. Segundo dados oficiais, apenas em 24 dias entre julho e agosto foram registradas 491 mortes violentas no país —um aumento de 5% em relação ao mesmo período de 2024.
A imensa maioria das mortes (97,6%) esta relacionada a disputas entre facções criminosas, e boa parte dos ataques envolveu atentados armados e explosões em espaços públicos. Embora o governo justifique a medida como resposta a uma “grave comoção interna” e cite grupos como o Tren de Aragua e dissidências colombianas, a Corte Constitucional já contestou a narrativa de que estejam presentes os requisitos para caracterizar um conflito armado interno.
A decisão reforça a percepção de que Noboa governa sob um clima permanente de exceção, em sintonia com sua estratégia de manter-se no centro da atenção pública.
O cálculo político do presidente é arriscado. Um resultado positivo na consulta popular reforçaria seu mandato e daria impulso à sua agenda. Já uma derrota parcial poderia estagnar o governo, além de gerar dúvidas em organismos como o FMI (Fundo Monetário Internacional) sobre sua capacidade de implementar reformas. Não faltam precedentes: em 2023, Guillermo Lasso também tentou inflar sua popularidade por meio de um referendo com oito perguntas e viu todas serem rejeitadas, numa votação que acabou acelerando o fim de seu governo.
O cenário atual não é tão favorável a Noboa quanto foi sua vitória eleitoral. A economia segue debilitada, com o risco de novos apagões, e a violência persiste em níveis alarmantes. Mesmo assim, o presidente insiste em apostar na consulta popular como palco para reafirmar sua liderança, transformando-a em mais uma arena de disputa política.