É nos Estados Unidos que o fenômeno das apostas esportivas online alcança mais pessoas. Desde que a Suprema Corte autorizou, em 2018, que cada estado decidisse sobre a legalização da prática, 38 estados permitem apostas online. A projeção a é de que o mercado alcance US$ 45 bilhões por ano.
O entusiasmo econômico dos grandes números, no entanto, não mitiga os danos às pessoas que apostam. Pesquisadores da Universidade da Califórnia analisaram dados de 7 milhões de americanos e constataram que, nos estados onde as apostas são legalizadas, houve piora significativa da saúde financeira da população. A pontuação de crédito caiu, os índices de inadimplência cresceram, o acesso a crédito diminuiu. Os impactos foram mais intensos entre jovens do sexo masculino, moradores de regiões de menor renda. Algoritmos, marketing e falta de perspectiva combinados para atingir quem já vive sob pressão.
Na Alemanha, uma coalizão de centros de pesquisa e universidades também alerta para os riscos das bets. O Atlas dos Jogos de Azar mostrou que 29,7% dos apostadores apresentaram algum grau de dependência. Ainda assim, 17 dos 18 clubes de futebol da Bundesliga foram patrocinados por casas de apostas. A discussão sobre restringir a publicidade avança, acompanhada da constatação de que os mais afetados são, mais uma vez, homens jovens e pessoas com histórico de migração.
Na Argentina, uma pesquisa realizada com mais de 7.000 adolescentes e jovens de 15 a 29 anos revelou que 22% já apostaram online. Entre esses, 25% disseram ter usado dinheiro que deveria ter outro destino —alimentação, transporte, estudos. O vício em apostas entre jovens pobres, que veem nos jogos não só um caminho de ganho financeiro, mas também de pertencimento, reconhecimento e desejo, se alastra como sintoma da ausência de perspectivas individuais e utopias coletivas.
Sem a regulamentação dos Estados, não há saúde nem física nem financeira possível quando, de um lado, há empresas com tecnologia sofisticada, campanhas multimilionárias e acesso irrestrito aos dispositivos móveis, e do outro, jovens em situação de instabilidade afetiva, econômica ou psíquica expostos a promessas de sucesso imediato.
Bélgica, Itália, Espanha e Reino Unido vêm adotando medidas desde a proibição completa da publicidade e do patrocínio esportivo até restrições de horário e proibição do uso de cartão de crédito para apostas.
O Brasil, que também legalizou as apostas em 2018, e regulamentou condições em 2025, já é o terceiro maior mercado do mundo. A recente suspensão de empresas que têm descumprido as normas é muito importante, assim como a recente aprovação no Senado da restrição de propagandas de bets.
Preocupante é a tributação das bets ter sido citada por membros do governo brasileiro como possível medida para equilibrar as contas públicas —alternativa para o provável recuo no aumento do IOF.
Precisamos deixar de tratar as apostas como fonte de receita ou entretenimento e reconhecê-las como um desafio internacional, que exige regulação rigorosa e políticas públicas de proteção a quem mais tem a perder.