Os riscos de ampliar a permissão para eutanásia – 20/06/2025 – Ross Douthat

Os riscos de ampliar a permissão para eutanásia - 20/06/2025


No último dia 9, o Legislativo do estado de Nova York aprovou um projeto de lei —agora à espera da assinatura da governadora Kathy Hochul— que permite o suicídio assistido para pessoas com diagnóstico de seis meses ou menos de vida.

Poucos dias antes da votação, minha colega Katie Engelhart publicou uma reportagem sobre as leis amplas que autorizam a “assistência médica para morrer” no Canadá. Essas leis foram ampliadas em 2021 para permitir o suicídio assistido mesmo para pessoas sem doenças terminais, e a reportagem detalha como funcionaram no caso específico de Paula Ritchie, uma canadense com doenças crônicas que foi eutanasiada a seu próprio pedido.

Muitas pessoas que apoiam o suicídio assistido em casos terminais têm reservas quanto ao sistema canadense. Por isso, vale refletir sobre o que torna instável um modelo que limita a eutanásia apenas a doenças terminais —e por que a lógica do que Nova York está fazendo aponta na direção do Canadá, mesmo que essa jornada não seja imediata nem direta.

Em um debate sobre eutanásia, fui questionado certa vez pelo marido de uma mulher que tentou, sem sucesso, conseguir suicídio assistido antes de morrer com dor: o que eu teria esperado que os médicos oferecessem a ela em vez da “solução silenciosa” que ela buscava? A implicação dele era que os médicos sempre precisam oferecer algo: normalmente isso significa cuidado e tratamento, mas no ponto excepcional em que nada mais pode ser feito, espera-se legitimamente que ofereçam outra coisa.

Essa é a lógica por trás das leis que permitem o suicídio assistido apenas para doentes terminais. Parte-se do pressuposto de que essas pessoas entraram numa zona única onde as promessas habituais da medicina já não podem ser mantidas —um estado de exceção no qual faz sentido licenciar médicos a oferecer a morte como forma de cura.

O problema é que a situação em que um médico diz que não há mais nada a ser feito não é assim tão excepcional. Todos os dias, todo tipo de pessoa ouve que sua dor ou sofrimento não tem solução médica: pessoas com lesões incapacitantes, com condições congênitas ou, como Ritchie, com múltiplos problemas de saúde cuja causa a ciência nem sequer compreende.

Todas essas pessoas, tanto quanto uma mulher morrendo de um tumor inoperável, estão em uma posição em que a medicina oficial não tem nada de significativo a oferecer. É verdade que, como não estão morrendo de forma iminente, podem nutrir mais esperança de uma eventual cura do que alguém com diagnóstico terminal. Mas também é verdade que, justamente por não estarem prestes a morrer, o alcance e a duração do seu sofrimento pode ser ainda maior.

Portanto, uma justificativa para o suicídio que enfatize o grito de socorro que a medicina não consegue responder, a necessidade de controle sobre o incontrolável, o desejo de curar uma dor que os médicos não aliviam, terá dificuldade para manter a doença terminal como uma categoria especial. Há simplesmente pessoas demais nessa posição excepcional, mas sem prazo definido para o fim de seu sofrimento.

Falo com alguma experiência pessoal: vivi anos com a forma crônica da doença de Lyme —uma condição cuja existência é controversa na medicina e que não tem cura oficial.

Se você nunca passou por algo assim, talvez reaja ao argumento acima dizendo: “Bem, pelo menos não deveríamos permitir o suicídio assistido para condições que podem ser psicossomáticas ou reflexo de doenças mentais —essa é uma linha fácil de traçar.” (Provavelmente alguns leitores pensaram isso ao ler sobre Ritchie.) Mas, dentro do mundo das doenças crônicas, essas distinções desmoronam. Mesmo que a doença de Lyme crônica fosse psicossomática (garanto que não é), alguém que sofre uma dor excruciante por um motivo mental obscuro pode se sentir ainda mais preso do que outros pacientes —ainda mais mergulhado naquele território em que a medicina falha.

Além disso, os tratamentos que me ajudaram a melhorar eram, do ponto de vista do consenso oficial, alternativos demais, estranhos ou arriscados demais para que um médico respeitável os recomendasse com segurança.

Enquanto isso, a morte é certa, confiável e —sob certa perspectiva— até segura. E a medicina oficial valoriza certeza e confiabilidade. A experiência canadense mostra isso com clareza: se as alternativas para uma pessoa que sofre desesperadamente envolvem tratamentos de baixa probabilidade que demoram para surtir efeito, alguma adaptação psicológica ou espiritual —ou então uma opção garantida que cumpre o que promete—, a opção garantida tende a suplantar as mais difíceis.

É por isso que, se você oferece essa opção sob condições supostamente restritas, as restrições tendem a ruir. O sofrimento é geral, não limitado; os doentes terminais não são uma categoria isolada; e o argumento a favor de uma solução letal acaba se expandindo para além dos limites originalmente impostos.

No fim das contas, é possível haver um consenso de que o suicídio é intrinsecamente errado, que o sofrimento deve ser suportado até o fim e que médicos não devem matar. Ou você pode abrir uma brecha para a morte que será estreita apenas no começo —e terminará como um portão escancarado, por onde muitas e muitas pessoas serão conduzidas.


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Fonte CNN BRASIL

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