“A ditadura segue nas periferias” era a frase estampada em preto no verso de fotos de jovens negros assassinados recentemente, espalhados por bancos da Catedral da Sé neste sábado (25). Estavam ao lado de fotos de desaparecidos políticos da ditadura cujo verso, em vermelho, perguntava “Onde estão os nossos desaparecidos?”.
O ato realizado 50 anos depois do assassinato de Vladimir Herzog pelo instituto que leva seu nome e a Comissão Arns lembrou o de 1975, bravamente realizado pelo Sindicato dos Jornalistas, representado naquela ocasião por Audálio Dantas, dom Paulo Evaristo Arns, o rabino Henry Sobel e o pastor Jaime Wright.
No último sábado, dom Odilo Scherer, o rabino Michel Schlesinger e a pastora Anita Wright, filha de Jaime, pregaram para representantes do Estado brasileiro, como o presidente em exercício Geraldo Alckmin e o ministro Paulo Teixeira. Participaram também a pianista Cida Moreira e o coro Luther King, estudantes da Escola Municipal Vladimir Herzog, Sérgio Gomes e Paulo Markun, companheiros de Vlado. Com a Polícia Militar na porta da igreja protegendo o encontro, não ameaçando como antes. Com fotos de Débora Maria da Silva, Mãe de Maio, e Marielle Franco projetadas no telão ao lado de Clarice Herzog, Eunice Paiva, Ana Dias, Zuzu Angel.
O púlpito também foi ocupado por Jurema Werneck, liderança do movimento de mulheres negras e diretora da Anistia Internacional no Brasil, Geraldo Alckmin, Ivo Herzog – acompanhado do irmão André, o filho Lucas e as sobrinhas Sofia e Helena –, o advogado José Carlos Dias, e a desembargadora Elizabeth Rocha, cuja intervenção reproduzo abaixo:
“Senhoras e senhores, estou presente neste ato ecumênico de 2025 para, na qualidade de presidente da Justiça Militar da União, pedir perdão a todos que tombaram e sofreram. Pedir perdão pelos erros e as omissões judiciais cometidas durante a ditadura”.
Os aplausos foram tantos. Seria este o primeiro pedido de desculpas a vítimas da ditadura feito por um representante dos militares no Brasil?
“Eu peço perdão a Vladimir Herzog e sua família, a Paulo Ribeiro Bastos e a minha família. A Rubens Paiva e Miriam Leitão e seus filhos. A José Dirceu, a Aldo Arantes, a José Genoino, a Paulo Vanucchi, a João Vicente Goulart e a tantos outros homens e mulheres que sofreram as torturas, as mortes, os desaparecimentos forçados e o exílio.”
Sentada ao lado de Matheus Leitão, autor de “Em nome dos pais”, livro em que narra a busca pelo delator e os torturadores de Miriam Leitão e Marcelo Netto, pude apertar sua mão. Busquei com os olhos Miriam, Zé Dirceu e Genoino, que estavam na Catedral. Mas não conseguia mais distinguir quem sentia o que naquele mar de vestes brancas.
“Eu peço, enfim, perdão à sociedade brasileira e à história do país pelos equívocos judiciais cometidos pela Justiça Militar Federal em detrimento da democracia e favoráveis ao regime autoritário. Recebam meu perdão, a minha dor e a minha resistência.”
Estaríamos testemunhando um primeiro passo?
Que papel imenso o da corajosa magistrada em nossa história. Porque passou da hora de militares abrirem os arquivos que permitam saber o que aconteceu com cada presa e preso político, se responsabilizarem por seus crimes e condenarem os que desviaram de suas funções de proteger a nação, torturando e matando quem lutava por democracia.
É por verdade, memória e justiça. É para interromper também o genocídio negro. Viva Vlado e a luta da família Herzog pelo Brasil.




