Ex-presidente dos bancos centrais do Canadá e do Reino Unido, o estreante na política Mark Carney venceu a eleição canadense desta segunda-feira (28) e assumirá o cargo de primeiro-ministro em meio a um dos maiores desafios dos últimos anos: a resposta às tarifas impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
A legenda de Carney, o Partido Liberal, derrotou os conservadores de Pierre Poilievre e voltou ao poder, mas provavelmente com um governo minoritário, frustrando os planos do novo premiê de obter maior força no Parlamento.
Aos 60 anos, Carney jamais havia ocupado cargo eletivo — fator que, em condições normais, poderia ter prejudicado sua candidatura. No entanto, sua trajetória como executivo do mercado financeiro e presidente de dois dos mais influentes bancos centrais do mundo pesou a seu favor. Durante a campanha, sustentou ser o único nome capaz de lidar com Trump.
Com estilo comedido e discurso técnico, Carney fez uma campanha discreta de cinco semanas sem cometer grandes erros. Segundo assessores, a combinação de firmeza e discrição foi estratégica.
“Já administrei orçamentos, economias e crises. Este é o momento de experiência, não de experimentos”, disse a jornalistas na semana passada, contrastando com o adversário conservador.
Carney assumiu a liderança do Partido Liberal em março, após a renúncia de Justin Trudeau, que deixou o cargo em meio a baixa popularidade, após quase dez anos como primeiro-ministro. Logo, tornou-se o primeiro premiê canadense sem experiência prévia como legislador ou ministro.
Uma de suas primeiras medidas foi revogar impostos impopulares, como a taxa sobre carbono para consumidores e mudanças no imposto sobre ganho de capital. Em seguida, convocou eleições, afirmando ser necessário enfrentar a nova política econômica dos EUA.
Natural de Fort Smith, no remoto território de Northwest, Carney estudou em Harvard e jogou hóquei no time universitário. Passou 13 anos no banco Goldman Sachs antes de ingressar no Banco Central do Canadá, onde se tornou presidente em 2008, aos 42 anos. É casado com Diana Fox Carney desde 1994. O casal tem quatro filhas.
Trajetória internacional
Sua atuação na crise financeira de 2008 rendeu elogios, com políticas inovadoras como linhas de crédito emergenciais e sinalizações claras sobre juros baixos por tempo determinado.
Em 2013, Carney foi convidado a comandar o Banco da Inglaterra, tornando-se o primeiro estrangeiro à frente da instituição em mais de 300 anos. No Reino Unido, lidou com inflação próxima de zero e o caos político do brexit.
Sua tentativa de orientar os mercados sobre a trajetória dos juros, prática conhecida como “forward guidance”, foi alvo de muitas críticas. Um parlamentar chegou a apelidá-lo de “namorado instável” devido à dificuldade em manter previsões consistentes.
Após o referendo do brexit, em 2016, fez um pronunciamento em rede nacional para acalmar os mercados, prometendo liquidez se necessário. Mesmo assim, foi acusado por apoiadores da saída da União Europeia de alarmismo. O deputado conservador Jacob Rees-Mogg o chamou de “sumo sacerdote do projeto do medo”.
De 2011 a 2018, Carney presidiu o Conselho de Estabilidade Financeira do G20. Após deixar o Banco da Inglaterra, foi nomeado enviado especial da ONU para finanças e mudanças climáticas.
Criou a Glasgow Financial Alliance for Net Zero, iniciativa para promover o compromisso do setor financeiro com a neutralidade de carbono. O grupo cresceu rapidamente, mas enfrentou resistência nos EUA, com críticas de estados republicanos e a saída de grandes empresas sob acusações de violação de regras antitruste.
Carney também integrou os conselhos do Brookfield Asset Management e da Bloomberg. Deixou todos os cargos corporativos ao assumir a liderança liberal.
“Se não há crise, você não me veria. Sou mais útil em momentos de crise. Não sou tão bom em tempos de paz”, disse a apoiadores em fevereiro.