A administração do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, está incentivando a Virgínia Ocidental a retirar a obrigatoriedade de vacinação escolar daqueles que alegarem questões religiosas. O posicionamento tem alarmado defensores da saúde pública que veem isso como parte de uma ação mais ampla para enfraquecer uma campanha eficaz de imunização.
Todos os estados têm leis que exigem certas vacinas para que os estudantes frequentem a escola. A Virgínia Ocidental faz parte de um grupo de cinco estados em que não há nenhuma exceção, incluindo Califórnia, Nova York, Connecticut e Maine.
Com um dos modelos de vacinação mais rigorosos do país, a Virgínia Ocidental está envolvida em uma disputa sobre a exigência do governador Patrick Morrisey de permitir que os pais recusem vacinas para seus filhos invocando suas crenças religiosas.
Em apoio aos esforços do governador, o Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA (HHS, na sigla em inglês) enviou uma carta aos servidores alertando que o estado pode estar violando leis de direitos civis.
O secretário do departamento de Saúde, Robert F. Kennedy Jr., é um crítico das vacinas e fundador de uma organização antivacina. Kennedy fez uma publicação no X apoiando Morrisey e prometendo “defender o direito de cada família de tomar decisões sobre saúde”.
Organizações antivacina têm travado uma batalha legal para forçar os estados a permitir exceções em casos de crença religiosa. Por outro lado, defensores da vacinação dizem que o governo federal está extrapolando suas atribuições.
Ambos os grupos veem a abordagem da administração em relação à Virgínia Ocidental como algo sem precedentes e um sinal de que outros estados podem ser os próximos alvos.
“O HHS está testando as águas do que podem fazer em relação a decisões estaduais sobre obrigatoriedade de vacinas para matrícula escolar”, disse Madison Harden-Stein, professora assistente de pesquisa da Escola McCourt de Políticas Públicas da Universidade de Georgetown.
Logo após assumir o cargo em janeiro, Morrisey ordenou que o estado permitisse que as pessoas reivindicassem o direito devido a crenças religiosas, mas outros funcionários resistiram.
A Câmara estadual, controlada pelo partido Republicano, rejeitou por pouco um projeto que teria tornado as exceções religiosas parte da lei estadual. Além disso, dois processos sobre o assunto estão tramitando nos tribunais da Virgínia Ocidental.
Na última segunda (25), Kennedy incentivou os legisladores estaduais a apoiarem Morrisey. “Sua ordem executiva defende a liberdade religiosa e os direitos dos pais da Virgínia Ocidental, mantendo o estado em total conformidade com a lei federal”, disse o secretário em uma publicação no X. O HHS “vai impor as proteções de consciência”, acrescentou.
Dias antes, o departamento de saúde enviou uma carta às autoridades da Virgínia Ocidental observando a falta de uma exceção religiosa na obrigatoriedade da vacinação escolar e instando o estado a fazer “esforços de boa-fé para garantir que ele e seus prestadores de serviços de saúde cumpram as robustas proteções de religião e consciência do nosso país”.
Del Bigtree, CEO da Informed Consent Action Network, uma organização antivacina, descreveu a intervenção do HHS na Virgínia Ocidental como “histórica”.
“Também sabemos que o presidente dos Estados Unidos apoia a liberdade de escolha quando se trata de decisões médicas”, disse Bigtree. “Isso é o que esperávamos desta administração.”
Dorit Reiss, um analista das leis de vacinas, disse que a carta é significativa porque não se lembra de o departamento de saúde já ter pressionado um estado a enfraquecer seu programa de vacinação.
“Kennedy está procurando reduzir as taxas de vacinação e tentando facilitar para os pais não vacinarem”, disse Reiss, professora de direito da Universidade da Califórnia em São Francisco. “Ele está tentando enfraquecer os requisitos de imunização escolar.”
Um porta-voz do HHS disse que os esforços se dão para “proteger os direitos de consciência e liberdade religiosa”.
Organizações antivacina estão há anos em campanha contra os programas de imunização.
A Informed Consent Action Network, por exemplo, financia um dos processos na Virgínia Ocidental. A organização obteve sucesso na criação de uma exceção religiosa no Mississippi, que, como a Virgínia Ocidental, há muito tempo se orgulha de ter uma das maiores taxas de vacinação do país entre crianças pequenas.
A Children’s Health Defense, organização sem fins lucrativos antivacina que Kennedy liderou antes de se tornar secretário, defende “acabar com essa perseguição” de proibir exceções devido a crença religiosa.
A carta do departamento de saúde para a Virgínia Ocidental poderia oferecer um “caminho a seguir” para outros estados sem tais exceções, disse a CEO Mary Holland em um artigo publicado no site da organização.
O HHS afirma que a Virgínia Ocidental não está sob investigação e se recusou a comentar se estava analisando outros estados.
A ampliação de exceções à obrigatoriedade de vacinação teria consequências terríveis, disse o presidente da Associação Médica Americana, Bobby Mukkamala, em um comunicado.
“Em um momento de erosão da confiança pública nas vacinas, particularmente com surtos de sarampo afetando comunidades em todo os EUA, permitir isenções não médicas de vacinas, como questões de crença religiosa, filosófica ou pessoal, exacerbará ainda mais doenças evitáveis por vacinas”, disse Mukkamala, acrescentando que tais isenções “colocam em perigo tanto aqueles que optam por não se vacinar quanto aqueles que desejam, mas não podem ser vacinados”.