Vencedora do Nobel: Lula tem de dizer a Maduro para partir – 17/10/2025 – Mundo

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Quando o aposto para se referir a ela mudou, e a líder da oposição venezuelana María Corina Machado passou a ser mundialmente conhecida como a nova Nobel da Paz, uma dúvida surgiu de imediato. A láurea poderia acelerar um processo de derrocada de Nicolás Maduro?

Para a própria Nobel, “este dia está próximo”, e há um protagonista responsável por isso. “O presidente Trump está fazendo muito para que isso aconteça“, diz ela nesta entrevista à Folha, a primeira a um veículo brasileiro desde que o Comitê Norueguês a contactou na madrugada do último dia 10 para comunicar sobre a premiação.

Na prática, o Nobel não alterou o dia a dia da líder opositora. María Corina segue clandestina, em local desconhecido, mas que afirma ser em território venezuelano. Entre aliados, diplomatas e jornalistas, especula-se ser uma embaixada. Isolada, afirma não encontrar presencialmente os filhos há dois anos.

Nesta conversa realizada por videochamada, ela aparece à frente de uma parede branca, o único cenário no qual é vista desde janeiro, quando brevemente rompeu a clandestinidade, foi à rua para um protesto e, em um dia de circunstâncias ainda nebulosas, relatou ter sido detida e depois liberada pelo regime.

María Corina, 58, defende as ações do governo Trump no mar do Caribe, que já mataram quase 30 supostos narcotraficantes, e nega que tivesse conhecimento da autorização dada por Washington à CIA para conduzir ações contra Maduro em solo.

Sobre o Brasil, afirma que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva precisa agir e usar o fino canal de comunicação que ainda tem com o regime para aconselhar Maduro a ir embora. Ela diz que, uma vez no poder, defenderia a integração sul-americana. Logo, adenda: “O Brasil tem uma enorme responsabilidade regional e não pode ser indiferente ao que ocorre na região. Precisamos garantir que nunca mais uma tragédia como a da Venezuela se repita em nosso continente.”

Em 2023, o Prêmio Nobel foi concedido à iraniana Narges Mohammadi, que estava presa naquele momento. A sra. não está detida, mas vive de forma clandestina. Sente que tem alguma liberdade? Como está sua vida?

Estou em isolamento físico total. Já faz 14 meses que estou absolutamente sozinha. Obviamente, me fornecem alimentos, mas estou completamente sozinha. E isso, claro, também me obrigou a refletir sobre essa nova forma de luta e a encontrar mecanismos para me comunicar com os venezuelanos e com o mundo, graças a Deus, por meio da tecnologia.

Sair do país, como fez seu aliado Edmundo González, ainda não é uma opção?


Se há um momento em que quero e devo estar na Venezuela, é agora.

Nenhum membro da sua família permanece em Caracas. Como se sente?


Sinto alívio por eles terem aceitado sair. Minha mãe não queria ir embora. Ela me disse: “Não vou te deixar sozinha.” E eu respondi: “Você vai sim, mamãe. Por favor, por mim, te peço que vá.” Foi muito difícil. Morro de vontade de abraçá-los.

Há quanto tempo não vê seus filhos?


Em dezembro, dois anos. Meu marido, minhas irmãs, meus companheiros que estão presos… É uma experiência extrema que a vida me impôs, mas que me fez valorizar muito mais o que significam a família, a liberdade, poder caminhar e estar em seu próprio país. E o que significa olhar nos olhos, sabe? Poder ver alguém ao vivo, sem que sempre haja uma tela no meio.

Que tipo de segurança seria necessária para a sra. deixar a clandestinidade?


A libertação da Venezuela. É a única coisa de que preciso.

A sra. sabia da decisão do presidente Donald Trump de autorizar a CIA a realizar ações secretas na Venezuela? O que pensa disso?


A operação que os Estados Unidos estão conduzindo é estritamente dirigida por eles, na qual nós não estamos envolvidos.

Há chavistas e também governos da América do Sul que temem uma intervenção armada na Venezuela, especialmente depois dessa notícia sobre a CIA. Isso seria uma saída?

Eu gostaria de que todos os governos da América Latina —alguns já o fizeram— se pronunciassem sobre a invasão que há anos ocorre em meu país, com a presença de agentes cubanos, russos, iranianos, a atuação livre de grupos terroristas como Hezbollah, Hamas, os cartéis de drogas —o próprio Cartel de los Soles— e a guerrilha colombiana. Eles ocuparam a Venezuela e infiltraram nossas instituições.

Pedimos ao mundo inteiro, durante anos, que reconheça que a tirania no nosso país não é uma ditadura convencional. Estamos falando de um regime criminoso e narcoterrorista que utiliza os recursos obtidos com suas atividades ilícitas para reprimir. É terrorismo de Estado para dentro e narcoterrorismo para fora. Temos pedido que esses fluxos sejam interrompidos, e precisamente essas ações no âmbito da operação antinarcóticos buscam cortar essas fontes de financiamento. E isso é algo pelo que nós, os venezuelanos —a imensa maioria—, agradecemos profundamente.

Sobre essas ações, o governo dos EUA afirmou já ter matado quase 30 pessoas em águas internacionais, na costa da Venezuela, como se fossem soldados inimigos, e não suspeitos de narcotráfico. Qual a sua opinião?

Quem declarou guerra aos venezuelanos e aos países deste hemisfério foi Nicolás Maduro. Desde o primeiro dia, depois da vitória eleitoral de 28 de julho, oferecemos a Maduro sentar-se para negociar os termos de uma transição ordenada, com garantias. Ele se negou. Declarou guerra e iniciou a pior onda de repressão. E assim como Maduro começou esta guerra, esperamos que os países da região —com a liderança do presidente Trump— ponham fim a ela de uma vez por todas.

A sra. sempre foi muito crítica sobre o papel do Brasil na questão venezuelana. Os asilados na embaixada argentina em Caracas, que estavam sob responsabilidade brasileira, saíram com ajuda dos Estados Unidos, sem que o Brasil soubesse. O que pedem que o Brasil faça agora?


Se há um momento de definições, é este. Aqui não há meios-termos. Há um povo que exerceu sua soberania em condições absolutamente extremas, injustas, ilegais —condições que vocês, no Brasil, jamais aceitariam. Do outro lado, está o cartel do narcoterrorismo, com Maduro e um grupo muito pequeno de civis e militares do alto escalão que estão fazendo fortunas obscenas à custa da fome do nosso povo. Diante disso, não há lugar para neutralidade, nem para silêncio. A história será implacável.

Além de não se calar, de forma prática, o que o Brasil pode fazer para ajudar em um momento de transição?


Acho que, neste momento, apesar das diferenças evidentes que surgiram entre o governo do Brasil e Nicolás Maduro —porque é claro que ele ultrapassou todos os limites, rompendo até antigas alianças—, ainda existem canais. 
Seria muito útil que o presidente Lula, assim como os demais chefes de Estado do continente, enviasse uma mensagem clara a Maduro: “Chegou a sua hora de ir embora. Acabou. Vá, para o seu próprio bem, Maduro. Aceite isso.”

Existe algum canal de comunicação com o Brasil hoje?


Por meio da chancelaria.

Se imaginarmos um cenário em que a oposição eleita assuma o governo e a Venezuela volte à democracia, há interesse em retomar um projeto de integração política e social entre os países da América do Sul?
Absolutamente sim. A tragédia venezuelana demonstrou que não é possível isolar as dinâmicas dentro das fronteiras. As redes do crime se expandiram —ontem mesmo o presidente [Gabriel] Boric denunciou, na Europa, o envolvimento do regime de Maduro em ordens para que o [grupo criminoso] Tren de Aragua assassinasse um dissidente em Santiago, no Chile. E eu também sinto que as dinâmicas de desenvolvimento, progresso, inclusão e geração de riqueza transcendem fronteiras e se fortalecem mutuamente.

A sra. dedicou o Nobel a Trump, cujo governo tem uma política muito clara contra migrantes em situação irregular nos EUA. A sra. conversa com ele sobre o tema dos migrantes venezuelanos?


A diáspora venezuelana é extraordinária, praticamente em sua totalidade. E, de fato, precisa de proteção — até o dia em que possa regressar à Venezuela. É uma proteção temporária. Estamos não apenas preocupados, mas trabalhando para que, no momento em que puderem voltar, estejam protegidos. Felizmente, este dia está próximo, e o presidente Trump está fazendo muito para que isso aconteça. Ele é o líder que mais claramente entende a necessidade de desmontar este sistema criminoso, e nós, venezuelanos, somos profundamente gratos a ele.

Gostaria de dizer algo mais?


Sim, quero me dirigir aos brasileiros. Primeiro, para agradecer. Vocês têm sido imensamente generosos, acolhendo milhares e milhares de venezuelanos. E quero dizer que uma Venezuela livre terá um enorme impacto positivo para o Brasil. Não apenas porque trabalharemos juntos em questões de segurança na fronteira e na recuperação ecológica após a devastação brutal na Amazônia e no Orinoco, mas também porque poderemos integrar duas nações que têm muito a compartilhar em energia, comércio, cultura, democracia e direitos humanos.
 O Brasil tem uma enorme responsabilidade regional, dada a dimensão de sua economia. E não pode ser indiferente ao que ocorre na região. Precisamos repensar os espaços de encontro regionais e sub-regionais para garantir que nunca mais uma tragédia como a da Venezuela se repita em nosso continente.


RAIO-X | MARÍA CORINA MACHADO, 58

Recém-premiada com o Nobel da Paz, é líder da oposição na Venezuela. Impedida de concorrer à Presidência, liderou a campanha opositora em torno da figura do diplomata Edmundo González no pleito de julho de 2024, que terminou com Maduro proclamado reeleito pelo aparato do regime sob acusações internacionais de fraude. Vive em clandestinidade, refugiada em local desconhecido, mas que diz ser em Caracas, desde os dias que sucederam aquela eleição. Engenheira, foi também deputada (2011-2014).



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