Já é amplamente conhecido que Sanae Takaichi, a “Dama de Ferro” primeira-ministra do Japão há uma semana, é uma grande fã de heavy metal.
Mas ao definir o tom para a visita histórica do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, nesta semana, a primeira mulher a ocupar o cargo no Japão pareceu recorrer a uma playlist bem mais suave: o equivalente diplomático de “It Was a Very Good Year” de Frank Sinatra, “Never Gonna Give You Up” de Rick Astley e “Top Gun Anthem” de Harold Faltermeyer.
Seis bolas de golfe douradas com o nome de Trump gravado foram demais? Não. Tudo funcionou tremendamente. Muito tremendamente. Trump, famoso por publicar, em 1987, anúncios de página inteira em jornais americanos para denunciar que o Japão se aproveitava dos EUA, iniciou as conversas na terça-feira (28) declarando: “Sempre tive um grande amor pelo Japão.”
O país asiático, enquanto isso, está começando a perceber que Takaichi passou décadas aperfeiçoando exatamente a capacidade de navegar esse tipo de momento. Em uma ascensão que durou 32 anos até topo da política japonesa, ela atravessou um pântano chauvinista de homens velhos, ao ponto em que, segundo amigos, pouca coisa pode hoje abalá-la.
Antes mesmo de pousar em Tóquio, Trump descreveu a nova primeira-ministra do Japão como “linda”. Quando Takaichi apertou sua mão na manhã de terça-feira, o presidente elogiou a força de seu aperto. A expressão de Takaichi não era nem bajuladora nem temerosa, mas de familiaridade com um tipo.
O desafio que ela enfrentava era enorme, no entanto. Recebendo o presidente dos EUA de volta a Tóquio para sua primeira visita em seis anos, a pressão sobre a líder japonesa era tanto emocional quanto diplomática. Na última vez que Trump esteve aqui, o país era governado pelo falecido Shinzo Abe —um mentor de Takaichi e um dos poucos líderes mundiais com quem Trump teve uma amizade genuína.
Sem Abe, nem Takaichi, que emergiu como primeira-ministra em meio a uma grave crise política, nem o governo japonês, que foi forçado a lutar por meses para garantir até mesmo um acordo tarifário unilateral e depende dos EUA para segurança em um mundo perigoso, poderiam se dar ao luxo de que esta viagem saísse do prumo. Mas Trump leva enorme incerteza aonde quer que vá.
Ainda assim, como Takaichi habilmente demonstrou, tanto ela quanto o Japão possuem um conjunto incomumente bom de cartas na manga para essas ocasiões. As empresas japonesas estão em posição de falar grandiosamente (embora não estejam, se você estuda as letras miúdas, com números específicos, datas ou detalhes) sobre futuros investimentos nos EUA. Dado que tanto Trump quanto Takaichi precisam de uma oportunidade fotográfica alertando a China sobre sua aliança de segurança inabalável, é conveniente que a base principal da maior frota naval avançada da América esteja a apenas 20 minutos de helicóptero militar ao sul de Tóquio.
Eclipsando todas essas vantagens, no entanto, está a adoração agora totalmente compartilhada entre EUA e Japão por Shohei Ohtani, o astro japonês do beisebol que joga pelo Los Angeles Dodgers. Assim como Ohtani aparentemente resolveu o beisebol, ele pode, inadvertidamente, ajudar a resolver a diplomacia EUA-Japão. Quando Trump se encontrou com o imperador japonês na noite de segunda-feira, eles falaram sobre Ohtani. Quando ele se encontrou com Takaichi na manhã seguinte, eles se acomodaram em duas cadeiras ornamentadas para assistir a alguns minutos de Ohtani jogando na World Series. Durante toda terça-feira, enquanto um jogo dos Dodgers contra o Toronto Blue Jays se estendia para um épico de 18 entradas, os 2 home runs de Ohtani estavam ao alcance para uma conversa de qualquer ministro, oficial ou diretor-executivo em Tóquio que precisasse deles.
Segura nesse terreno esportivo compartilhado, Takaichi pôde executar sua playlist amigável a Trump. Em reuniões no ornamentado Palácio Akasaka, ela atingiu o presidente dos EUA com uma lembrança dos dias de glória de sua amizade com Abe, tão emocional quanto o nostálgico “It Was a Very Good Year” cantado por Sinatra. A entrega de presentes é uma das mais altas formas de arte do Japão: a decisão de Takaichi de presentear Trump com o putter (tipo de taco de golfe) que Abe usou quando os dois jogaram golfe juntos pela última vez foi uma obra-prima do gênero.
A estratégia “Never Gonna Give You Up” foi então a de agradar o presidente com um tema remetendo à “nova era dourada” —uma linha da retórica de Trump que, repetida e enfaticamente, afirmou que trocas comerciais imensas seriam feitas entre os dois países, que a amizade EUA-Japão seria mais forte do que nunca e que ele e Takaichi terão um “relacionamento fantástico”.
Quando os dois chegaram à base naval dos EUA em Yokosuka, voando de helicóptero para o convés de um porta-aviões de propulsão nuclear, o ato de camaradagem estava em níveis próximos aos do filme americano “Top Gun” (1986). Como se assumindo o papel do coadjuvante sempre presente e amigo do protagonista do filme, Takaichi declarou que o Japão, ainda constitucionalmente pacifista, está “pronto para contribuir ainda mais proativamente para a paz e estabilidade na região”.
Foi um grande, embora às vezes confuso, passeio. “Quero apenas que você saiba —a qualquer momento que tiver alguma pergunta, alguma dúvida, qualquer coisa que queira, quaisquer favores que precise, qualquer coisa que eu possa fazer para ajudar o Japão, estaremos lá”, disse Trump quando a cúpula principal foi concluída. Takaichi poderia razoavelmente ter respondido pedindo à América para abandonar a tarifa de 15% que havia imposto ao seu querido amigo, ou talvez sua insistência para que Tóquio desembolsasse um investimento colossal nos EUA, nos temos de Washington.
Este não era o dia para testar a profundidade da boa vontade de Trump, no entanto. A promessa do presidente dos EUA de favores futuros é algo que, como diz o título de uma música dos heróis do heavy metal de Takaichi, a banda britânica Iron Maiden, ela pode “Remember Tomorrow” (Lembrar amanhã).




